sábado, 2 de junho de 2012

Um inacreditável "gol contra” na praia de Itaipu



Secretário Estadual da Pesca ignora a real situação da pesca artesanal, dá uma de prefeito a assina projeto de urbanização do Canto de Itaipu, além de drenagem e pavimentação da região oceânica de Niterói.

Por: Laura França – jornalista e ex-administradora do Parque Estadual da Serra da Tiririca.

O Secretário Felipe Peixoto reuniu autoridades municipais e moradores no Museu de Arqueologia de Itaipu, na tarde de 29 de maio, para assinar dois contratos de urbanização, com recursos garantidos pelo governo do estado. Em meio a muitos aplausos, saiu da cartola o plano redentor, na plataforma/palanque lotada: “Programa de requalificação urbana das comunidades pesqueiras”. Requalificar o espaço urbano do pescador artesanal? Esse até poderia ter sido o título do megaprojeto da Veplan que rasgou ao meio a praia de Itaipu, há cerca de três décadas, elitizando o “balneário de Camboinhas”. Sim, porque há referências explícitas no projeto atual: “Inclusive boa parte dos assentamentos localizados no entorno dessas áreas pesqueiras são inadequados”.

Acima de tudo, o secretário surpreendeu com o maior foco do projeto: a drenagem de 10 sub-bacias da região oceânica de Niterói. Esse é o maior pleito das associações de moradores, que aguardam respostas da Prefeitura, há décadas. Quem não conhece o slogan: “Moro em Itaipu, vivo na lama”? Casas inundadas e ruas intransitáveis são marcas da região onde se registra o maior IPTU do município. Assim, a platéia ficou de fato encantada e agradecida ao “secretário/salvador”, que chegou a receber pedidos de ampliação, de inclusão de outros bairros. Em tempos de escassez, de administração municipal inoperante, o representante do governo estadual ocupa a vaga de trainee para Prefeito. Tudo bem, consideram quase certo que isso acontecerá, algum dia... Mas, no contexto atual – poluição do mar, crime ambiental licenciado pelo órgão estadual –, o gestor da política estadual da pesca tem o dever de atuar para reverter esse quadro de degradação ambiental, para melhorar a qualidade e a quantidade dos berçários marinhos e estoques pesqueiros, garantia da sobrevivência do pescador artesanal e da biodiversidade marinha. Mas, questionado sobre isso, o secretário da pesca recorreu ao já tão conhecido jogo de empurra, atribuindo responsabilidades a outros órgãos, integrantes do próprio governo estadual, e até ao recém-criado Comitê das Lagunas de Itaipu e Piratininga, organização não governamental, talvez criada para legitimar a política do Estado. Diante disso, é preciso lembrar aos gestores públicos, do estado e do município, que os fatos estão sendo observados e avaliados no dia a dia das comunidades, democraticamente.

   
   PESCA ARTESANAL DE ITAIPU EM RISCO DE EXTINÇÃO

Às vésperas da  Rio+20 - Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável (2012) -  que tem por eixo a “erradicação da pobreza por meio da economia verde”, um crime ambiental em pleno estado-sede, o Rio de Janeiro, coloca em risco toda uma comunidade tricentenária de pescadores artesanais.

Diariamente, toneladas de lixo resultantes de dragagem do Canal do Cunha e do Porto do Rio são despejadas no mar de Itaipu, em Niterói, pela Cia. Docas, com licença do INEA/SEA, apesar de se tratar de zona de amortecimento da área marinha do Parque Estadual da Serra da Tiririca. Isso afronta também o artigo 47 da Lei Federal 12.305/10, que proíbe o lançamento de resíduos sólidos ou rejeitos no mar; além da Convenção das Nações Unidas sobre Direito do Mar, que prevê um rígido controle da poluição marinha. Os pescadores relatam que as embarcações despejam o lixo “praticamente em cima dos seus barcos” todo dia, causando um desastre social e ambiental imensurável: - redes completamente danificadas; parcéis destruídos; migração de espécies; queda na produção de pescado da região.  Esse crime socioambiental, praticado à luz do dia, provoca o comprometimento alarmante da renda dos pescadores artesanais de Itaipu-Niterói, comunidade tradicional assim reconhecida por antropólogos da UFF que a pesquisam constantemente.
Pesca artesanal: atividade milenar praticada em nossa orla - a pesca artesanal de Itaipu é tombada como patrimônio imaterial da cidade de Niterói pela Lei  2874/2012, de autoria do vereador Renatinho do PSOL.

Esses estudos embasaram a Lei Municipal 2874/2011, de autoria do Vereador Renatinho, que transforma em patrimônio cultural da Cidade de Niterói a Pesca Artesanal da Praia de Itaipu, aprovada sem vetos em 20/3/2012. Há também uma indicação para a criação de uma Reserva Extrativista Pesqueira - RESEX, visando proteger esse ambiente marinho e seus recursos pesqueiros, para conservar o espaço dos pescadores. O Canto de Itaipu já conta, também, com outros instrumentos legais de proteção cultural e ambiental.
Além do lixo no mar, a comunidade é prejudicada pela presença de embarcações de grande porte (plataformas e navios), relacionadas à exploração do petróleo e à pesca predatória, que rotineiramente usam a enseada de Itaipu. Como se não bastassem os impactos negativos atuais, está em processo de licenciamento no INEA o duto do COMPERJ (emissário submarino de venenos químicos), que vai despejar toneladas diárias de efluentes industriais no mar de Itaipuaçu, afetando toda a biodiversidade marinha, toda a cadeia alimentar da área tradicional da pesca artesanal de Itaipu e de Maricá.
Os pescadores resistem, lutam pela garantia de permanecer em suas terras, pelo direito ao uso sustentável da biodiversidade biológica componente dos diversos ecossistemas e pela sua conservação.  O mar e a lagoa, a partir da atividade da pesca artesanal, são espaços culturalmente criados pelas comunidades que transmitem seu bem imaterial de geração a geração.
                      MAR LIMPO PARA TODOS!





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