Objetivando corrigir um erro crasso contido no Projeto de Lei nº 074/2011, que cria o Fundo Municipal de Mobilidade Urbana – oriundo da mensagem Executiva nº 074/2011, o vereador Renatinho (PSOL) apresentou em 26/04 uma emenda que suprimia o Inciso III do Artigo 2º do citado PL.
O objetivo do vereador Renatinho, presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara, era solucionar equívoco da proposta enviada à Câmara pelo governo, já que a Lei nº 2.662/2009, que criou o Fundo de Urbanização, Habitação e Regulamentação Fundiária (FUHAB), possui mesmo dispositivo encontrado na proposta do Fundo de Mobilidade, destinando a mesma verba aos dois Fundos Municipais simultaneamente.
O Projeto de Lei em tela não tem, quanto aos seus objetivos nenhum problema, senão aquele apontado por Renatinho e ignorado pelos demais vereadores e principalmente pelo Procurador Geral do Município que, quebrando a regra de independência entre os poderes, interviu diretamente na votação emitindo parecer jurídico que foi distribuído para a base do governo, incentivando a que desconhecessem o erro contido no Projeto de Lei.
Diz o Projeto de Lei aprovado por 15 votos SIM e 01 NÃO, com a ausência justificada do Vereador Waldeck (PT):
Art. 1º Fica criado o Fundo Municipal de Mobilidade Urbana que dará suporte financeiro às políticas públicas municipais de melhoria da mobilidade urbana, a fim de proporcionar o acesso amplo e democrático ao espaço de forma segura, socialmente inclusiva e sustentável, priorizando a implementação de sistemas de transportes coletivos, dos meios não motorizados (pedestres e ciclistas), da integração entre diversas modalidades de transportes, bem como implementação do conceito acessibilidade universal para garantir a mobilidade de idosos, pessoas com deficiências ou restrição de mobilidade.
Parágrafo único. O Fundo de que trata o caput deste artigo tem natureza contábil-financeira, sem personalidade jurídica, rege-se pela legislação pertinente e vincula-se à Secretaria Municipal de Fazenda.
São claros, portanto, os objetivos pelos quais o Poder Executivo pretende criar tal fundo. Nosso questionamento, entretanto, se baseia nas parcelas que, segundo o governo, conformarão os recursos do fundo bem como, e principalmente, a base legal que sustenta tal composição. A criação de fundos, qualquer que seja o ente da federação, parte do disposto nos artigos 71 a 74 da Lei federal nº 4.320, de 17 de março de 1964, que “estatui normas gerais de direito financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federação.”. Aqueles artigos estabelecem:
TÍTULO VII
Dos Fundos Especiais
Art. 71. Constitui fundo especial o produto de receitas especificadas que, por lei, se vinculam à realização de determinados objetivos ou serviços, facultada a adoção de normas peculiares de aplicação.
Art. 72. A aplicação das receitas orçamentárias vinculadas a fundos especiais far-se-á através de dotação consignada na Lei de Orçamento ou em créditos adicionais.
Art. 73. Salvo determinação em contrário da lei que o instituiu, o saldo positivo do fundo especial apurado em balanço será transferido para o exercício seguinte, a crédito do mesmo fundo.
Art. 74. A lei que instituir fundo especial poderá determinar normas peculiares de controle, prestação e tomada de contas, sem de qualquer modo, elidir a competência específica do Tribunal de Contas ou órgão equivalente.
O primeiro dos questionamentos está ligado ao conteúdo do Art. 71. As receitas que constituirão o fundo precisam ser claramente especificadas em lei e se vincularem a realização dos objetivos do fundo, quais sejam, os de melhorar a mobilidade urbana.
No Art. 2º do PL 000074 / 2011 estão definidas as receitas que comporão o fundo. Destas, uma em especial não satisfaz o imposto no Art. 71 da referida Lei 4320/64, quais sejam aquelas definidas no inciso III, a saber:
III - receitas decorrentes de contrapartidas estabelecidas para mitigar os impactos negativos ao trânsito decorrentes de empreendimentos imobiliários, que somente poderão ser aplicadas com o fim a que se destinam desde que conforme finalidades estabelecidas nesta lei;
O primeiro problema a ser apontado é que NÃO EXISTE no ordenamento jurídico municipal, tampouco no nacional que lhe pudesse servir de base, regras para quantificação de impactos negativos no trânsito decorrentes de empreendimentos imobiliários e, muito menos ainda, a correspondente compensação pecuniária. Esta fonte de receita precisa ser definida em lei e, portanto, não pode ser definida por Decreto ou Ato Administrativo do Poder Executivo.
Não bastasse este óbice legal e até constitucional, existe outro que adicionalmente causa embaraço aos cidadãos que olhem de maneira crítica o resultado do trabalho executado pela administração pública municipal. Analisemos a Lei Municipal nº 2.121/2004 que ainda vige, e com alta relevância na ordem jurídica do Município. Tal lei, posteriormente alterada pelas leis 2372 de 20/07/2006 e 2662 de 02/12/2009, que criou o Fundo Municipal de Urbanização, Habitação e Regularização Fundiária, estabeleceu no seu Art. 2º, tal qual no presente Projeto de Lei, as receitas que compõem o fundo, das quais ressaltamos duas para análise:
III - receitas decorrentes da aplicação da outorga onerosa do direito de construir e de alteração de uso, de operações consorciadas e de outros instrumentos de intervenção urbana previstos no Estatuto da Cidade, Lei Federal 10.257 de 10 de julho de 2001, e na legislação municipal;
VIII - contrapartidas estabelecidas para mitigar impactos negativos decorrentes de empreendimentos imobiliários, que somente poderão ser aplicadas com o fim a que se destinam desde que conforme finalidades estabelecidas nesta lei;
O inciso III, além dos tradicionais fontes orçamentárias de receita que compõem o fundo, satisfaz claramente o disposto no Art. 71 da Lei federal 4320/64 visto que a aplicação da outorga onerosa do direito de construir (solo criado), além de respaldada no Estatuto da Cidade, foi incorporada ao ordenamento jurídico municipal pela Lei nº 2123/04 que atualizou o Plano Diretor da cidade.
As contrapartidas para mitigação de impactos negativos decorrentes de empreendimentos imobiliários, até hoje não definidas em lei, não podem ser destinadas ao novo Fundo de Mobilidade Urbana, a menos que definido também em lei. A simples intenção de repartir, retirando, recursos do FUHAB para outro fundo público qualquer precisa obrigatoriamente pelo COMPUR e ser submetido à audiências públicas realizadas tanto pelo Poder Executivo quanto pelo Poder Legislativo.
“A cidade está em um momento crítico com relação à habitação popular. Não tenho nada contra a criação de um Fundo especifico para a mobilidade urbana, no entanto não podemos admitir que desguarneçam o FUHAB, que arrecada conforme previsão do Estatuto das Cidades, para passar a verba para um novo Fundo que não se sabe exatamente para o que servirá. A cidade precisa é parar de crescer, chega de prédios! Não adianta alargar ruas e continuar crescendo a quantidade de carros. Quero ouvir o COMPUR e toda a população. Tenho duvidas se obras nas vias solucionarão o problema da mobilidade urbana com prédios e mais prédios sendo construídos todo dia, mas não tenho duvidas de que precisamos muito de habitação popular.”, explicou o Vereador Renatinho (PSOL).
Estas são, resumidamente, as razões pelas quais Renatinho apresentou e defendeu a emenda derrubada pelo Plenário e sendo assim votou contra a aprovação do Projeto de Lei que terminou por criar este Fundo ilegal e imoral. O vereador Renatinho questionará a legalidade da aprovação da lei e fará representação ao Ministério Público cobrando que medidas judiciais sejam tomadas contra a vigência da mesma. Renatinho lembra ainda que, para este tipo de proposta é preciso realizar reuniões especificas com integrantes do Conselho Municipal de Política Urbana (Compur) e audiências publicas com a população interessada.
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