Por Milton Temer
A morte do cinegrafista Gelson Domingues, da TV Band, obriga
uma reflexão sobre o trabalho imposto aos profissionais de TV, na cobertura de
eventos policiais.
Obrigados a se transformar em protagonistas nos invasões
bélicas que a Polícia realiza sobre comunidades carentes, cinegrafistas e
repórteres operam sob risco permanente de morte.
E por que se tornam protagonistas? Não é difícil explicar.
Tornam-se protagonistas porque são parte de uma operação política de porte
maior, que se inicia bem fora e bem acima das próprias chefias de redação.
Estabelecidas através das relações promíscuas entre a cúpula do aparelho do
Estado e as próprias empresas, quase todas com identidade ideológica bastante
conservadora. Coincidentes, portanto, com a visão do próprio governador, haja
vista a primeira das grandes invasões, no morro do Alemão. Ali houve eliminação
de inocentes, comprovada pela pesquisa posterior, tornada pública, do então
responsável pela Comissão de Direitos Humanos da OAB-RJ, João Tancredo, e o
deputado Marcelo Freixo (PSOL). E não foi em baixo volume o canto de louvor que
os telejornais entoaram na ocasião.
Haja vista também a forma generosa com que Estado e
Prefeitura do Rio conviveram com as famigeradas milícias, em convívio e apoio
que não ocultavam. Estão aí os YouTubes da vida para confirmar.
É evidente, portanto, que há uma operação planejada. As
redações são avisadas previamente das operações, porque ninguém adivinha o que
ainda não ocorreu, de molde a pautar o assunto, visando dois objetivos.
O primeiro é a afirmação tão a gosto do senso comum de que o
"governo não tergiversa com o tráfico". Pode até ser verdade, quando
isso se localiza no ataque à ponta do varejo; aquela sem poder econômico para
alcançar segmentos do Estado envolvidos com as mega-operações.
Criminalizar a pobreza é considerado natural pela parcela
mais alienada e reacionária da sociedade, área em que o governador e seu
prefeito da Capital lançam a rede na pesca de votos.
Quando escrevo, imagens dos telejornais começam a mostrar os
presos na operação que vitimou o cinegrafista - um bando de pés-de-chinelo
sobre os quais se concentrará a investigação sobre o autor do disparo, através
de perícia na arma apreendida -.
E alguém terá que fazer muito esforço para me convencer com
a ladainha - olhando para o retrato da quadrilha - de que violência não tem
nada a ver com miséria e pobreza; com falta de alternativa de vida digna; com
puro ajuntamento de monstros que, em qualquer condição social, seriam
criminosos.
Pode até ser. Estão aí os banqueiros e sonegadores de toda
ordem, contra os quais sequer se pode usar algema na hora da prisão. Aí,
ninguém cogita de examinar o caráter sociopatas de cada um deles. Estão bem
vestidos, frequentam locais sociais onde convivem, e negociam patrocínios de
eventos, com membros proeminentes da magistratura.
O segundo objetivo é bélico. É tática militar. É usar os
meios de comunicação para implantar, pela imagem da tropa que invade
super-equipada uma favela, o terror contra os futuros alvos a abater. Ou seja;
inteligência usada não para isolar o tráfico sem tiroteio, mas para alimentar a
idéia de que tudo será resolvido na bala. Com a aplicação de pena de morte
através dos ditos "autos de resistência".
E não digam ser isto utópico, inalcançável, porque a própria
Polícia Civil do Rio já deu exemplo disso, na captura do assassino do
jornalista Tim Lopes, sem um único disparo. Por agentes da banda boa, que não
opera pela execução, mas pela prisão e posterior condenação judicial.
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